De #Tóquio2021 a #FujaDeTóquio: 5 hashtags da crise de Covid-19 no Japão

De Toyohashi (Japão)

Mais de 70 dias após o primeiro caso confirmado de Covid-19 no Japão, o primeiro-ministro Shinzo Abe declarou estado de emergência nesta terça (7). Com duração de um mês, a medida vale para sete províncias: Tóquio, Chiba, Fukuoka, Hyogo, Kanagawa, Osaka e Saitama.

Segundo a lei japonesa, o estado de emergência não prevê impor lockdown (confinamento) como em outros países –Tóquio, a maior metrópole do mundo, é uma das poucas megacidades que não aderiu ao isolamento para conter o avanço do novo coronavírus. Mas a declaração garante a governadores a possibilidade de “pedir” que a população fique em casa.

Colégios, cinemas, bares, baladas, museus e lojas de departamento devem ter uso limitado ou suspenso. Farmácias, supermercados e serviços básicos como fornecimento de luz, internet, gás e água continuam funcionando normalmente.

Foi-se, porém, impressão de “normalidade”. Até agora o país foi menos afetado pela pandemia que Europa, Estados Unidos e Brasil, mas, desde fins de março, após o adiamento da Olimpíada (remarcada para 2021), o número de novos casos aumentou consideravelmente: em dez dias, saltou de 1.693 casos e 52 mortes (em 28 de março) para 3.654 casos e 85 mortes (em 6 de abril), segundo dados da Universidade Johns Hopkins.

Até dia 6 de abril, as dez das 47 províncias japonesas com mais casos eram Tóquio (1.116), Osaka (423), Chiba (283), Kanagawa (239), Aichi (239), Hyogo (215), Saitama (201), Hokkaido (194), Fukuoka (162) e Quioto (126).

Foi um longo caminho até a declaração, sob pressões de políticos (como os governadores Herofumi Yoshimura, de Osaka, e Yuriko Koike, de Tóquio), empresários (como Masayoshi Son e Hiroshi Mikitani, magnatas da indústria da tecnologia), especialistas (incluindo Yoshitake Yokokura, presidente da Japan Medical Association), famosos e anônimos.

Estas cinco hashtags, trending topics (assuntos mais comentados) no Twitter, marcaram momentos-chave e ajudam estrangeiros a entender a cronologia da crise de Covid-19 no Japão:

#JustCancelIt

Ao longo de fevereiro, o número de casos confirmados pulou de 20 para 241. Na época, a situação parecia sob controle –tanto que organizadores e autoridades asseguraram a continuidade do calendário e afastaram rumores de cancelamento da Olimpíada na capital japonesa por conta do surto de coronavírus, um discurso que se arrastou por meses.

Entretanto, no Twitter japonês já subia a hashtag #JustCancelIt (“apenas cancele”), referência ao clássico mangá “Akira”, de Katsuhiro Otomo, publicado na década de 1980. Na história, Tóquio é destruída na Terceira Guerra Mundial e, reconstruída como Neo-Tóquio, será sede da Olimpíada de 2020.

Um dos quadrinhos mostra o número 147 na contagem regressiva até os Jogos, o equivalente a 28 de fevereiro deste ano. Ao lado do painel está pichado “chuushu da chuushi”, que pode ser traduzido como “cancele, apenas cancele”.

 

#Tokyo2021

Atletas de diversas nacionalidades, como o nadador brasileiro Nicholas Santos, o decatleta americano Ashton Eaton e o triatleta espanhol Fernando Alarza, publicaram posts com a hashtag #Tokyo2021 ao longo de março, endossando o movimento de federações e comitês pedindo o adiamento dos Jogos Olímpicos.

Em 24 de março, o Comitê Olímpico Internacional anunciou o adiamento para 2021, fato inédito na história olímpica moderna. Após a decisão, o país registrou uma escalada de novos casos: 114 em 25 de março, 225 em 28 de março, 317 em 2 de abril, 522 em 4 de abril.

 

#StayHomeJapan

Após a alta de casos de fins de março, anônimos e famosos passaram a divulgar a campanha digital #StayHome (“fique em casa”) no país –pela primeira vez, meses após o início do surto.

O músico japonês Yoshiki Hayashi é um dos mais ativos: além de tuítes, gravou a música “Sing for Life” em apoio às quarentenas internacionais, com Bono Vox (do U2), Jennifer Hudson e will.i.am (rapper do Black Eyed Peas).

A artista japonesa Masora Fukuda, que vive nos Estados Unidos, publicou o vídeo “Dear me 10 Days ago – US to Japan”, uma colagem de depoimentos de seus amigos americanos, endereçada aos jovens japoneses, destacando o quanto a situação dos surtos pode se agravar e chamando a atenção para a importância da quarentena.

 

#AbeNoMask

Apesar das pressões e dos recordes de novos casos, o primeiro-ministro Shinzo Abe declarou ao parlamento que não era a hora de declarar estado de emergência em 2 de abril. “Por enquanto, as infecções estão sob controle”, justificou.

Enquanto líderes de diversos países instauravam quarentenas e restrições de movimento, Abe anunciou uma medida inusitada para controlar o avanço do vírus: a distribuição de duas máscaras reutilizáveis por casa japonesa até o fim de abril. Há cerca de 50 milhões de residências e 127,3 milhões de habitantes no país.

O premiê se tornou alvo de críticas, como descreveu o jornalista japonês Tomohiro Osaki, por lançar uma proposta muito aquém das medidas esperadas do Estado diante da grave crise. “É uma brincadeira de 1o de abril?”, tuitou o escritor japonês Naoki Hyakuta.

A internet não perdoou: no Twitter, viralizou a hashtag #AbeNoMask (“máscara de Abe”) e diversos memes, como montagens com o premiê vestindo duas máscaras, uma delas cobrindo os olhos –lembra a icônica imagem do presidente Jair Bolsonaro tentando ajeitar a peça no rosto, durante entrevista à imprensa no Brasil.

 

#EscapeTokyo

Após a declaração de estado de emergência, em 7 de abril, uma tendência inusitada se instalou: ao invés de aumentar o apoio a campanhas pró-isolamento social, o simples “fique em casa”, #EscapeTokyo (“fuja de Tóquio”) subiu aos trending topics do Twitter no Japão.

A ideia é sair da capital, o atual foco, cuja área metropolitana abriga 35 milhões de pessoas, e ir para a casa da família ou de amigos no interior para se isolar –o que pode implicar deslocamentos, viagens e, voilà, novas infecções.

“Isso só vai espalhar o vírus”, alertou o médico Nobuhiko Okabe, um dos integrantes do painel de especialistas do governo japonês, segundo a agência Reuters. “É preciso aguentar. Não devemos nos apressar para ir embora”, disse.

Em outras palavras: não é hora de fugir, mas de ficar em casa, pelo bem de todos, arquipélago adentro e mundo afora.